Aqui você vai encontrar pensamentos de alguém que não aceita as coisas como são, que não tolera frases como "sempre foi assim, não vai mudar". Não esqueça são apenas pensamentos, e eles nem sempre farão sentido para você.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

A turba da Uniban


(5/11/2009)

Folha de São Paulo
CONTARDO CALLIGARIS

As turbas têm um ponto em comum: detestam a ideia de que a mulher tenha desejo próprio
NA SEMANA passada, em São Bernardo, uma estudante de primeiro ano do curso noturno de turismo da Uniban (Universidade Bandeirante de São Paulo) foi para a faculdade pronta para encontrar seu namorado depois das aulas: estava de minivestido rosa, saltos altos, maquiagem -uniforme de balada.
O resultado foi que 700 alunos da Uniban saíram das salas de aula e se aglomeraram numa turba: xingaram, tocaram, fotografaram e filmaram a moça. Com seus celulares ligados na mão, como tochas levantadas, eles pareciam uma ralé do século 16 querendo tocar fogo numa perigosa bruxa.
A história acabou com a jovem estudante trancada na sala de sua turma, com a multidão pressionando, por porta e janelas, pedindo explicitamente que ela fosse entregue para ser estuprada. Alguns colegas, funcionários e professores conseguiram proteger a moça até a chegada da PM, que a tirou da escola sob escolta, mas não pôde evitar que sua saída fosse acompanhada pelo coro dos boçais escandindo: Pu-ta, pu-ta, pu-ta.
Entre esses boçais, houve aqueles que explicaram o acontecido como um justo protesto contra a inadequação da roupa da colega. Difícil levá-los a sério, visto que uma boa metade deles saiu das salas de aula com seu chapéu cravado na cabeça.
Então, o que aconteceu? Para responder, demos uma volta pelos estádios de futebol ou pelas salas de estar das famílias na hora da transmissão de um jogo. Pois bem, nos estádios ou nas salas, todos (maiores ou menores) vocalizam sua opinião dos jogadores e da torcida do time adversário (assim como do árbitro, claro, sempre vendido) de duas maneiras fundamentais: veados e filhos da puta.
Esses insultos são invariavelmente escolhidos por serem, na opinião de ambas as torcidas, os que mais podem ferir os adversários. E o método da escolha é simples: a gente sempre acha que o pior insulto é o que mais nos ofenderia. Ou seja, veados e filhos da puta são os insultos que todos lançam porque são os que ninguém quer ouvir.
Cuidado: veado, nesse caso, não significa genericamente homossexual. Tanto assim que os ditos veados, por exemplo, são encorajados vivamente a pegar no sexo de quem os insulta ou a ficar de quatro para que possam ser usados por seus ofensores. Veado, nesse insulto, está mais para bichinha, mulherzinha ou, simplesmente, mulher.
Quanto a filho da puta, é óbvio que ninguém acredita que todas as mães da torcida adversa sejam profissionais do sexo. Puta, nesse caso (assim como no coro da Uniban), significa mulher licenciosa, mulher que poderia (pasme!) gostar de sexo.
Os membros das torcidas e os 700 da Uniban descobrem assim um terreno comum: é o ódio do feminino -não das mulheres como gênero, mas do feminino, ou seja, da ideia de que as mulheres tenham ou possam ter um desejo próprio.
O estupro é, para essas turbas, o grande remédio: punitivo e corretivo. Como assim? Simples: uma mulher se aventura a desejar? Ela tem a impudência de querer? Pois vamos lhe lembrar que sexo, para ela, deve permanecer um sofrimento imposto, uma violência sofrida -nunca uma iniciativa ou um prazer.
A violência e o desprezo aplicados coletivamente pelo grupo só servem para esconder a insuficiência de cada um, se ele tivesse que responder ao desejo e às expectativas de uma parceira, em vez de lhe impor uma transa forçada.
Espero que o Ministério Público persiga os membros da turba da Uniban que incitaram ao estupro. Espero que a jovem estudante encontre um advogado que a ajude a exigir da própria Uniban (incapaz de garantir a segurança de seus alunos) todos os danos morais aos quais ela tem direito. E espero que, com isso, a Uniban se interrogue com urgência sobre como agir contra a ignorância e a vulnerabilidade aos piores efeitos grupais de 700 de seus estudantes. Uma sugestão, só para começar: que tal uma sessão de Zorba, o Grego, com redação obrigatória no fim?
Agora, devo umas desculpas a todas as mulheres que militam ou militaram no feminismo. Ainda recentemente, pensei (e disse, numa entrevista) que, ao meu ver, o feminismo tinha chegado ao fim de sua tarefa histórica. Em particular, eu acreditava que, depois de 40 anos de luta feminista, ao menos um objetivo tivesse sido atingido: o reconhecimento pelos homens de que as mulheres (também) desejam. Pois é, os fatos provam que eu estava errado.


Wânia Pasinato
Socióloga
Pesquisadora Sênior do NEV/USP
Pesquisadora - PAGU/UNICAMP
Consultora da SPM/PR  para o Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência contra as Mulheres no Estado de São Paulo

Carta da União Nacional dos Estudantes (UNE) sobre a decisão da Uniban

Concordo com a carta redigida pela UNE sobre a expulsão da aluna Geisy. Tivemos agora mais uma prova da sociedade falocêntrica em que vivemos e a reprodução do senso cumum, que naturaliza as relações de gênero, dentro do espaço acadêmico.


A carta: 

Episódio de violência sexista acaba em mais uma demonstração de machismo No dia 22 de outubro, o Brasil assistiu cenas de selvageria. Uma estudante de turismo da Universidade Bandeirante (São Paulo) foi vítima de um dos crimes mais combatidos na sociedade, a violência sexista, que é aquela cometida contra as mulheres pelo fato de serem tratadas como objetos, sob uma relação de poder desigual na qual estão subordinadas aos homens. 

Nesse episódio, a estudante foi perseguida e agredida pelos colegas, hipoteticamente pelo tamanho de vestido que usava, e só pôde deixar o campus escoltada pela polícia. Alguns dos alunos que a insultaram gritavam que queriam estuprá-la. Desde quando há justificativa para o estupro ou toleramos esse tipo de violência?

Pasmem, essa história absurda teve um desfecho ainda mais esdrúxulo. A Universidade, espaço de diálogo onde deveriam ser construídas relações sociais livres de opressões e preconceitos, termina por reproduzir lamentavelmente as contradições da sociedade, dando sinais de que vive na era das cavernas. Além de não punir os estudantes envolvidos na violência sexista, responsabiliza a aluna pelo crime cometido contra ela e a expulsa da universidade de forma arbitrária, como se dissessem que, para manter a ordem, as mulheres devem continuar no lugar que estão, secundárias à história e marginalizadas do espaço do conhecimento.

É naturalizado, fruto de uma construção cultural, e não biológica, que os homens não podem controlar seus instintos sexuais e as mulheres devem se resguardar em roupas que não ponham seus corpos à mostra. Os homens podem até andar sem camisa, mas as mulheres devem seguir regras de conduta e comportamento ideais, a partir de um padrão estético que a condiciona a viver sob as rédeas da sociedade, que por sua vez é controlada pelos homens.

Esse desfecho, somado às diversas abordagens destorcidas do fato na mídia, demonstram a situação de opressão que todas nós, mulheres, vivemos em nosso cotidiano. Situação em que mulheres e tudo o que está relacionado a elas são desvalorizados e depreciados. A mulher é vista como uma mercadoria - ora utilizada para vender algum produto, ora tolhida de autonomia e direitos, ora violentada, estigmatizada e depreciada. É essa concepção que acaba por produzir e reproduzir o machismo, violência e sexismo, próprios do patriarcado. Tal concepção permitiu o desrespeito a estudante.

Nós, mulheres estudantes brasileiras, em contraposição a essa situação, estamos constantemente em luta até que todas as mulheres sejam livres do machismo, da violência, do desrespeito e da opressão que nos cerca. Repudiamos o ato de violência dos alunos contra a estudante de turismo, repudiamos a reação da mídia que insiste em mistificar o fato e não colocar a violência de cunho sexista no centro do debate e denunciamos a atitude da universidade de punir a estudante ao invés daqueles que provocaram tal situação.
Exigimos que a matrícula da estudante seja mantida, que a Universidade se retrate publicamente e que todos os agressores sejam julgados e condenados não somente pela instituição, a Uniban, mas também pela Justiça brasileira. Somos Mulheres e Não Mercadoria! 

Diretoria de Mulheres da UNE - União Nacional dos Estudantes

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Os jovens estão descontrolados

Quem viu a algazarra absurda realizada por estudantes em uma universidade do ABC paulista, segundo eles, pelo comprimento do vestido de uma aluna?

Eu fiquei chocada com as imagens gravadas pela tecnologia moderna em celulares e disseminada a todos pela internet. Dentro do campus universitário inúmeros alunos grintavam, xingavam e excumungavam uma aluna por seu vestido curto e provocante. Gostaria de saber em que século nós estamos? Se eu não me engano já faz muito tempo que se queimava "bruxas" em praça pública.

Que moralismo hipócrita é esse? Onde está o respeito com o ser humano? A questão não é o tamanho do vestido, mas sim a falta de respeito com os sentimentos alheios. Não interessa se a menina provocou o fuzuê com sua sensualidade ou vulgaridade, somos seres racionais e não animais descontrolados.

Alguns justificam tal atitude com o argumento de que a menina provocou a cituação com sua roupa. Então vamos retroceder e justificar o estupro por causa de uma blusa transparente? O que me apovara mais do que as atitudes são os argumentos, matou-se um índio com fogo por pensar ser um mendigo, espancou-se uma doméstica porque acharam ser uma prostituta e, agora, humilha-se uma mulher em publico porque a julgaram vulgar!

O descaso com o outro, o não reconhecimento do indivíduo e a falsa moralidade me chocam. As cenas na universidade são repulsivas. Esses jovens consideram-se acima do bem e do mal, julgam o outro com base em seus preconceitos.

O imoral desta história com certeza não era a menina com o vestido curto!